
Na época em que Tejupá ainda se chamava Belo Monte, havia o “Bairro dos Franco”, onde um habitante aprendeu que a mentira tem pernas curtas de um modo cômico. Tratava-se de Zé Franco, um sujeito magro e de longas barbas brancas que na linha da boca viviam num amarelado constante, marca das gemas de ovo caipira consumidas diariamente.
Nhô Zé acreditava em assombração, dizia ter visto o saci e frequentemente cavalgava até Belo Monte para comprar pastilhas Valda para sua bronquite. Possuía um cacoete – pronunciava um “quá” entre uma frase e outra.
Certa vez, passando pelo melancial de Antônio Ezequiel, deparou-se com uma grande quantidade de melancias prontas para serem colhidas e se deliciou com as frutas, sem perceber que algumas sementes ficaram presas em sua vasta barba. Depois de se fartar de melancias, dirigiu-se até o proprietário das frutas e comentou: “Seu Antônio, passei agora pelo vosso ‘melanciá’ e vi muita melancia madura. Quá! Não colhi nenhuma, não era minha…”
Nhô Antônio, reparando nas sementes presas na barba do Zé, logo compreendeu tudo e tirou um sarro: “Já que o senhor não colheu nenhuma, com certeza alguma melancia deve ter explodido na sua cara, já que tem semente até na sua barba”. Constrangido por ter sido pego mentindo, Zé Franco constatou que a mentira tem pernas curtas, soltou um “quá” e acrescentou: “é… não tem jeito de mentir mesmo”.
Outra figura contemporânea do pessoal dessas memórias é um velho desajeitado que, na época, era conhecido pelos moradores das roças da região como Alferes Galinha (no linguajar do povo, “Alfer” Galinha).
Hoje em dia, o termo “alferes” não é mais utilizado no meio militar, já que a patente foi substituída por “segundo-tenente”. “Alfer” Galinha deve ter ganhado a alcunha por sua personalidade combativa, ou então como uma espécie de chacota à sua intenção revolucionária. Sempre que possível, o homem organizava manifestações contra o governo (na época o Brasil vivenciava a era Vargas) e também contra o sistema. As pessoas o definiam como “manifestadô”.
Mariquinha era criança quando “Alfer” Galinha estava no auge de suas atividades contestadoras, portanto não tem recordações a respeito das justificativas para os atos políticos naquele período histórico, tampouco sabe o nome real desse revolucionário da roça, mas acredita que, se fosse vivo hoje em dia, diante da situação política da região e do Brasil como um todo, o “Alfer” teria a agenda e a pauta de reivindicações lotadas, seria manifestação atrás de manifestação.


