Artigos escritos nos anos 90 surpreendem pela atualidade ainda nos dias de hoje
Enquanto a imprensa e os “cidadãos de bem” execravam a ocupação do MST numa fazenda de Águas de Santa Bárbara em meados de 1995, Hamilton Maluly defendia os sem-terra com veemência em seus artigos no jornal Observador.
A sociedade careta, carola e direitista de Piraju desaprovava as referidas colunas, que ocupavam parte da página de artigos do semanário na época.
Num combo de desaprovação e falta de compreensão para ironias e sarcasmo, aconteceu da gordaça e ricaça Isopeida Pinto Guimarães se tornar um elemento indigesto para os “cidadãos de bem” desta localidade.
Personagem satírica criada por Mah Luly – que já assinava seu nome assim -, Isopeida era uma socialite casada com Bonifácio, um elemento da alta burguesia, enriquecido da maneira mais vil – fraudes e exploração. O casal detestava os pobres, a ralé, a esquerda, os “comunistas”, os “petistas” e toda a sorte dos desafortunados. A personagem feminina ia à igreja ostentando um terço de diamantes, era chegada da classe alta local e tomava drinks no extinto “Tropical”. Envolvidíssima nas questões políticas da classe abastada que representava, “Iso” subia no palanque junto com Nelson Ned, uma companhia muito melhor que a de Chico Buarque de Holanda, que desde os tempos áureos apoiava o Lula (isso na opinião da própria personagem).
Em crônicas debochadas, irônicas e deliciosas, Mah Luly punha o dedo na ferida da elite de um modo jamais antes realizado na imprensa do Tijuco Preto – fez muita gente refletir, pensar e se divertir, mas também ofendeu e irritou, como é obrigação da esquerda provocar.
Teatro
Hamilton Maluly não defendeu as pautas de esquerda e ironizou as da direita somente no jornal, embora sempre tenha feito uso da arte para se expressar politicamente. Em 1968, em plena ditadura militar, escreveu e dirigiu a peça “Caos” no palco do Nove de Julho, um musical e manifesto político em apoio aos vietnamitas (inimigos dos EUA), exaltando o estilo hippie e o amor livre, com rock’n’roll ao fundo.
Antes que as autoridades policiais o abordassem pela ousadia, já que pegara a fama de subversivo, Mah Luly migra para São Paulo, onde participa e produz novas peças, algumas com a equipe do Teatro Paiol. Mencionando algumas: Adeus Geralda, Bye Bye Pororoca e “Meu bofe disse-me adeus”, essa última recebendo, inclusive, o maior prêmio do Teatro Nacional.
Retornou, enfim, a Piraju, escrevendo para jornal e sem deixar de lado o espírito combativo contra as injustiças sociais e mantendo aquele talento especial de apontar os podres da sociedade despertando o riso e o pensamento crítico.
Uma pena que os leitores da terrinha não tenham lhe compreendido; uma pena que o cenário social brasileiro tenha somente disparado ladeira abaixo dos tempos de Mah Luly pra cá; uma pena que os pirajuenses continuem tão caretas e reacionários.
Hamilton Maluly
Nasc.: 31/08/1941
Falecimento: 28/08/2014






