Naomi Oliveira Corcovia
Como boa parte das pessoas alfabetizadas de sua geração, Henrique Arthidoro Nardini assinava uma infinidade de jornais e era fã dos almanaques, livros e periódicos. Num tempo em que não existia TV, era a mídia impressa que mantinha essa galera informada sobre os acontecimentos do mundo e que proporcionava uma contextualização dos fatos históricos da época.
Filho de Rosmunda Conti e João Nardini, Henrique nasceu em Boituva (SP) em 1º de março de 1911 e teve quatro irmãos: Doro, Emílio, Zita e Atílio. Aos 14 anos, mudou para Piraju, onde trabalhou no telégrafo e depois, por indicação do “Seu Filete”, chefão da Estação Sorocabana, virou conferente de armazém de café, ocupação que manteve até se aposentar.
Em 1934, casou-se com Carmen Barone, com quem teve seis filhos: Sylvia, João, José Roberto (“Teto”), Sebastião, Arlete e Luiz (“Gijo”). Enviuvou em 1954 e posteriormente casou-se com Áurea Mercadante e teve três filhos: Antonello, Tereza Cristina e Andréa.
Henrique nunca foi à escola. Aprendeu a ler com uma jovem negra contratada pelos pais para alfabetizar as crianças em casa e, criado o hábito de leitura, estava sempre cheio de assunto e por dentro das novidades, embora fosse de falar pouco.
Era leitor assíduo do Comércio de Piraju e dos grandes jornalões paulistas, além de ser cliente fiel do livreiro Luiz Cruz, que abastecia a casa com as novidades literárias do momento, incluindo romances “água com açúcar” para as mulheres. Também era fã de música e colecionava discos de vinil. Chamava a criançada para ouvir as melodias mais bonitas e também para ler ou ouvir as notícias mais interessantes do jornal.
HOBBIES
Além do trabalho e da leitura, dedicava-se aos “pets”. Em seu quintal, criou de um tudo: gatos, cachorros, galinhas, pavões, perus, faisões de quatro espécies diferentes, macacos, pacas, coelhos, cavalos, hamsters, quatis, tartarugas, papagaios com anilha e tudo e chegou a ter até um veadinho que alguém pegou no meio do mato e lhe deu de presente após o lançamento da animação “Bambi”.
Tinha um fraco pelas aves, colecionava canários de muitos tipos e, esporadicamente, convocava os netos para limpar as gaiolas. Teve pássaros exóticos, incluindo um uirapuru, espécie amazônica de canto excepcional. Rezava a lenda que o animal dava sorte, então compartilhava as penas que o passarinho derrubava com as pessoas queridas. Quando o uirapuru morreu, guardou o corpo do bichinho numa pirâmide transparente e manteve como amuleto.
Certa vez foi procurado por um japonês de forte sotaque que queria trocar um cão chihuahua por um papagaio. Topou o negócio e assim adotou o trêmulo cãozinho Kuma, um mijão de carteirinha que fazia xixi em tudo e em todos, até nas visitas.
Depois de aposentado, passou a vender relógios e joias. Bem relacionado, Henrique tinha diversas amizades, uma delas era o Senhor Gilberto Polenghi, com quem rascunhou alguns versos que se perderam com o tempo.
De temperamento às vezes explosivo, Nardini era uma figura ativa e generosa, que gostava da companhia dos amigos e familiares e subia e descia a Estação a pé diariamente. Era ele quem mantinha a família unida e ficava emburrado caso alguém não aparecesse por um dia para dar um alô ou se recusasse um convite para assistir ao jogo do Palmeiras – era tão palmeirense que chegava a levar os filhos meninos para a capital, de trem, todos uniformizados, para assistir às partidas do Palestra no estádio.
Frequentava os jogos de carteado do Clube Nove de Julho e gostava muito de viajar para Ourinhos e principalmente pra São Paulo para fazer compras, assistir a peças de teatro, óperas, ir ao cinema (depois narrava o enredo do filme para a família). Era fã do “Holiday on Ice”, espetáculo no gelo, e marcava presença no show sempre que o grupo se apresentava na capital.

Voltava de viagem com as sacolas lotadas de relógios, doces, chocolates finos, pães de forma (coisa que não era comum em Piraju), frutas importadas e flores. Adorava ir à feira para provar e comprar melancia, uma de suas frutas preferidas. Fã de fotos e da arte da fotografia, instalou um pequeno estúdio em sua casa, onde toda a família revelou muitas imagens.
Foi um dos primeiros pirajuenses a ter um aparelho de televisão e, na Copa de 1958, sua TV atraía pequenas multidões de gente a fim de assistir aos jogos.
Faleceu em 9 de janeiro de 1985.



